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O consumo de produtos à base de Cannabis para fins medicinais tem aumentado significativamente no Brasil, resultando em impactos econômicos no Sistema Único de Saúde (SUS).
Segundo a Fiocruz, nos últimos 20 anos, o uso clínico de substâncias derivadas da planta, como canabidiol (CBD) e tetrahidrocanabinol (THC), cresceu, e parte desse acesso é custeada pelo governo por meio de ações judiciais. Em 2023, os gastos públicos com o fornecimento desses produtos ultrapassaram R$ 165 milhões.
Uma pesquisa realizada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sugere que o canabidiol (CBD), molécula presente na maconha, pode contribuir para a preservação dos neurônios. O estudo investigou os efeitos do CBD no cérebro de camundongos, com foco em compreender como a substância pode ajudar a prevenir crises em pacientes com epilepsia durante o uso medicinal.
O trabalho, liderado pelo biólogo João Paulo Machado, no Laboratório de Eletrofisiologia, Neurobiologia e Comportamento (Lenc) do Instituto de Biologia (IB), identificou alterações na função de quase três mil genes, principalmente em estruturas associadas à produção e economia de energia das células.
Publicado no Acta Neuropsychiatrica, periódico científico da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, o estudo é considerado a primeira investigação que analisa a ação molecular do CBD diretamente no cérebro. O professor e orientador André Vieira destaca a relevância dessa pesquisa para o entendimento dos potenciais benefícios do canabidiol na medicina.
Dificuldades na autorização
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Pesquisadoras da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) analisam os processos judiciais movidos contra a União para obtenção dos produtos de Cannabis. O grupo, formado por Claudia Garcia Serpa Osorio de Castro, Ângela Esher, Claudia Du Bocage e Catia Veronica Oliveira, investiga as indicações médicas, o perfil dos pacientes e os produtos mais requisitados, tanto os comercializados no Brasil quanto os importados com autorização da Anvisa.
As pesquisadoras apontam que a crescente demanda impulsionou a atuação de indústrias nacionais, que obtiveram autorização sanitária para fabricação e comercialização desses produtos. Além disso, há quase 600 itens importados à base de Cannabis com permissão de entrada no país pela Anvisa.
Para facilitar o acesso, a agência criou regulamentações específicas, permitindo a importação e a fabricação local de óleos, extratos e tinturas. No entanto, por não serem considerados medicamentos, esses produtos não passam por todas as etapas de avaliação de eficácia, segurança e qualidade.
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A pesquisa começou em 2024 e o grupo de estudo alerta que as evidências científicas para a maioria das indicações ainda são limitadas, o que levanta preocupações sobre o impacto na saúde pública.
A regulação atual é considerada frágil, permitindo a expansão de um mercado nem sempre alinhado às diretrizes sanitárias. Segundo as pesquisadoras, a Anvisa deveria adotar uma postura mais criteriosa quanto à regulamentação desses produtos, considerando tanto as evidências científicas disponíveis quanto a comercialização e importação.
Regulação e desafios
As discussões sobre o uso da maconha, seja para fins medicinais ou de recreação, voltaram à tona após o Supremo Tribunal Federal (STF) começar a analisar os recursos apresentados contra a decisão que descriminalizou o porte de até 40g de maconha para uso pessoal.
Apesar de existirem quase 600 produtos de Cannabis permitidos para importação, apenas um medicamento à base da planta é registrado no Brasil. Isso ocorre porque, para um produto ser considerado medicamento, são necessários estudos rigorosos de eficácia, segurança e qualidade, o que não acontece com a maioria dos produtos à base de Cannabis.
A liberação do canabidiol para o tratamento de epilepsia refratária em crianças gerou grande mobilização social. No entanto, os fabricantes não submeteram pedidos de aprovação para medicamentos nacionais.
Para atender à demanda crescente, a Anvisa flexibilizou as normas, criando novas categorias regulatórias e permitindo a importação de óleos e a produção nacional de extratos e tinturas. Assim, surgiram alternativas regulatórias que facilitaram o acesso, mas sem comprovação robusta de eficácia para diversas condições médicas.
De acordo com a Fiocruz, muitos produtos comercializados possuem composições desconhecidas e não são submetidos a fiscalização rigorosa, já que não se enquadram como medicamentos. Os princípios ativos da Cannabis variam, e o THC, por exemplo, tem propriedades psicoativas e deve ser limitado a 0,2% de concentração, salvo em cuidados paliativos. Contudo, a fiscalização desse limite é falha, tornando incerta a real composição dos produtos disponíveis no mercado.