Marcelo Santos: médico alvo da polícia de SC oferecia cirurgia ‘X-Tudo’; entenda

O médico Marcelo Evandro dos Santos virou alvo de uma operação de busca e apreensão da Polícia Civil de Santa Catarina na quarta-feira (29). Ele é indiciado por deformar pelo menos 15 pacientes em Florianópolis com procedimentos cirúrgicos, chegando a realizar cirurgia “X-tudo” em uma mulher. A intervenção resultou na perda dos seios da paciente.

Marcelo Evandro dos Santos, médico alvo da polícia de SC

Marcelo Evandro dos Santos, médico alvo da polícia de SC, é indiciado por deformar pelo menos 15 pacientes com procedimentos cirúrgicos – Foto: Redes Sociais/Reprodução/ND

Com a operação policial, Santos teve seus bens bloqueados. Os imóveis e itens apreendidos chegam na casa dos R$ 10 milhões. O bloqueio visa garantir uma possível indenização às vítimas. Dois veículos do suspeito também foram recolhidos, além de equipamentos eletrônicos e documentos.

Ao todo, foram seis mandados de busca e apreensão realizados nas residências e clínicas do cirurgião, em Florianópolis e Balneário Camboriú. O inquérito apura prática de crimes de lesão corporal grave e gravíssima, dano psicológico, perseguição, crimes contra as relações de consumo e crimes tributários.

Médico alvo da polícia de SC já foi condenado por erro em cirurgia

Marcelo Santos responde a pelo menos outros oito processos envolvendo erros em cirurgias plásticas e chegou a ser condenado pela Justiça em um deles. Uma paciente também morreu após passar por um procedimento realizado pelo cirurgião, no Paraná.

Um levantamento do programa Domingo Espetacular, da Record TV, identificou que o profissional já sofreu sanções, inclusive, de órgãos reguladores, como o CRM-PR (Conselho Regional de Medicina do Paraná).

Em 2015, ele foi advertido por assumir o risco de realizar uma cirurgia múltipla e de longa duração. À época, conforme o documento, ele não tinha registro para atuar como cirurgião plástico naquele estado.

Paciente morreu após fazer nova cirurgia com o médico

Em 2012, uma mulher, de 39 anos, foi submetida a uma cirurgia de lipoaspiração feita por Marcelo em Curitiba, no Paraná. A paciente não gostou do resultado, mas decidiu fazer uma nova intervenção com o médico. Ela apresentou um quadro de insuficiência respiratória logo no início do procedimento e morreu no mesmo dia.

Perfil no Instagram de médico alvo da polícia de SC

Paciente do Paraná morreu após procedimento cirúrgico com Santos em 2012 – Foto: Redes Sociais/ Reprodução/ ND

Conforme identificado no levantamento dos processos, a clínica do cirurgião não tinha uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e a paciente precisou ser transferida para atendimento em um hospital – onde foi constatada a morte cerebral. O médico teria prestado auxílio financeiro à família da vítima, no entanto, teria desaparecido após ela ser enterrada.

Na condenação, Marcelo foi sentenciado a pagar indenização de R$ 100 mil para cada um dos dois filhos e ao marido da vítima – totalizando R$ 300 mil – mas, segundo a família, o valor nunca chegou a ser quitado e o processo criminal segue em aberto.

Procedimentos ‘X-Tudo’ realizados pelo cirurgião

Na cirurgia plástica, é comum que profissionais e pacientes decidam pelos procedimentos combinados para que mais áreas do corpo passem por intervenções, sob efeito de apenas um protocolo anestésico, o que diminui o tempo de recuperação.

Os procedimentos cirúrgicos combinados não são proibidos pela SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica). No entanto, o profissional deve alertar o paciente sobre os riscos e ficar atento às orientações, como: não exceder o limite de retirada de gordura (até 7% do peso corporal), não ultrapassar mais que 40% da superfície do corpo e não deixar o tempo de protocolo anestésico passar de 8 horas.

Paciente teve lesões permanentes após cirurgia plástica

Paciente teve lesões permanentes após cirurgia plástica – Foto: Arquivo pessoal/ Reprodução/ ND

A neuropsicopedagoga Letícia Mello pagou R$ 83 mil por uma cirurgia plástica combinada com Marcelo que, segundo ela, era chamada por ele de cirurgia ‘X-Tudo’. O procedimento no qual ela foi submetida incluiu 12 intervenções, durou cerca de 10 horas e retirou 7 kg de gordura.

A paciente, de Santa Catarina, perdeu os dois seios e ficou 20 dias com feridas abertas, o que resultou em cicatrizes em diferentes partes do corpo.

Em nota à reportagem do programa da Record TV, a defesa do cirurgião afirmou que “jamais realizou ‘8 procedimentos’” e que Letícia fez apenas três: “lipoenxertia, mamas e bodytite”. Na nota, a defesa também diz que Marcelo “jamais foi condenado em qualquer instância criminal“.

Além de Letícia, a auditora em saúde Andrea Pieper, outra paciente que fez cirurgias com o médico em SC, perdeu toda a mama esquerda e parte da direita. Ela diz que recebeu alta do hospital mesmo apresentando um quadro grave de infecção.

“Vi meu seio apodrecendo. A bactéria ‘comeu’ três camadas da pele, então afundou”, desabafa Andrea.

O médico alvo da polícia de SC também responde a outras ações, incluindo uma condenação “por danos morais, materiais e estéticos” da Justiça catarinense que fixou indenização em R$ 9.655. A defesa da vítima entrou com recurso para aumentar o valor a ser pago pelo cirurgião.

Pacientes relatam ofensas e mutilações após procedimentos

A empresária Karoliny Matias, de 35 anos, buscando melhorar o aspecto dos seios após amamentar dois filhos, consultou com diferentes cirurgiões plásticos até chegar ao consultório do médico Marcelo Evandro.

O primeiro contato da Karoliny com o médico foi através das redes sociais. Quando foi à consulta, ela relatou à reportagem que foi “muito bem atendida” e percebeu “uma simpatia surreal” da parte do cirurgião.

“Dentre os três médicos com quem consultei, escolhi ele para realizar meu sonho. Até brinde fizemos quando fechamos o procedimento”, contou.

Primeiro contato de Karoliny com Marcelo Evandro dos Santos aconteceu pelas redes sociais

Primeiro contato de Karoliny com Marcelo Evandro dos Santos aconteceu pelas redes sociais – Foto: Arquivo pessoal/ Reprodução/ ND

A empresária recebeu uma herança do pai e usou parte do valor para custear a cirurgia plástica, um total de R$ 33 mil à vista. Ela pagou pela mastopexia (cirurgia para reposicionamento das mamas) com prótese de silicone e, por conselho do médico, uma lipoaspiração da gordura na região de axila.

O procedimento, que dura em média quatro horas, demorou nove para ser concluído. Assim que teve alta, na manhã seguinte, começou o sofrimento da empresária. Dia após dia, as dores foram aumentando e os resultados, cada vez mais distantes do que era esperado.

“Eu olhava meu peito muito feio, sem forma. Depois de sete dias, nada de mudanças, continuava reto e com muita dor. Quando fui tirar meu dreno, minha auréola estava com feridas e ele me disse que era normal”, relatou, com tristeza, à reportagem.

Karoliny fez fisioterapia e massagens modeladoras durante um ano para tentar dar contorno aos seios que, segundo ela, ficaram achatados, disformes e de tamanhos diferentes. As cicatrizes ficaram com caroços de pele repuxada. Os mamilos, sem qualquer definição.

Médico alvo da polícia de SC diz que seguiu todos os procedimentos necessários

Em nota à imprensa, o cirurgião plástico alegou que, antes de cada operação, “todos os exames necessários” são solicitados para prestar “o atendimento mais personalizado e humano possível”.

Marcelo Evandro dos Santos, cirurgião plástico indiciado

Marcelo Evandro dos Santos, cirurgião plástico indiciado após paciente ser mutilada e deformada, se defende das acusações – Foto: Redes Sociais/Reprodução/ND

Dessa forma, ele afirma que “todas as orientações” foram fornecidas e que “existem condições biológicas inerentes a cada paciente”.

Ele também citou ser membro de, pelos menos, três sociedades de cirurgiões plásticos, tanto no Brasil quanto no exterior. Assim, ele diz estar “em constante atualização”, bem como “realizando cursos de qualificação e participando de congressos voltados ao conhecimento e aprimoramento do domínio dos procedimentos em cirurgia plástica”.

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