‘Cem Anos de Solidão’ recria paisagem de Macondo com sons de mais de 60 aves


Série lançada em dezembro contou com apoio de um ornitólogo para gravar os animais em campo. Descubra algumas espécies icônicas da produção. Gulungo ou mochileiro, um dos pássaros ouvidos na série ‘Cem Anos de Solidão’ da Netflix
Memo Gómez
Como recriar os sons de um lugar que não existe? Este foi o desafio da equipe de design e produção sonora da série Cem Anos de Solidão, lançada em dezembro na Netflix e inspirada no romance de Gabriel García Márquez.
A história se passa inteiramente em um vilarejo fictício chamado Macondo, no Caribe colombiano. Um povoado pequeno e mágico, com raízes históricas e culturais. Por ser o país com a maior biodiversidade de aves do mundo, os produtores desejavam expressar toda essa riqueza sonora de maneira meticulosa.
Ao todo, foram gravadas mais de 90 espécies de aves. Embora nem todas tenham sido usadas, o ornitólogo Diego Calderón Franco afirma que pelo menos 60 foram inclusas. Para realizar a gravação, ele e o engenheiro de som Sebastián Martínez viajaram durante uma semana por dez lugares do Caribe colombiano captando sons em campo.
Diego Calderón durante a gravação de cantos das aves
Rodrigo Gaviria
“Além das aves, gravamos sons de outros animais, como macacos bugios, macacos-prego, grilos, cigarras, rãs e até animais de fazenda, como cabras, vacas, cavalos e porcos. Esses sons foram fundamentais para dar vida ao ambiente de Macondo e ao Caribe colombiano”.
Para dar vida a Macondo, a diretora Laura Mora escolheu a cidade de Alvarado, na região de Tolima. No entanto, durante a pós-produção, a equipe percebeu que os sons capturados no set não eram suficientes para representar o Caribe colombiano.
Contratado pela empresa WhereNext para liderar a expedição, Diego trabalhou com uma lista de espécies prioritárias, incluindo aves associadas a personagens específicos, como o guacamayo (associado a Melquíades) e outras para ambientes como a casa dos Buendía e a praça de Macondo.
Ele explica que, com os sons da fauna, é possível aumentar ou reduzir a tensão, dar foco a momentos da trama e até mesmo criar silêncio para destacar cenas específicas. Quando o som é interrompido, isso pode intensificar momentos de conflito ou reflexão entre os personagens. Por outro lado, sons ricos e variados ajudam a criar a sensação de realidade em um cenário.
Sanhaço-de-encontro-azul (Thraupis cyanoptera)
Rodrigo Gaviria Obregón
“A importância dos pássaros na trama é que eles levam o espectador para dentro e para fora. Eles o colocam na vida real do filme, mas também podem tirá-lo magicamente do contexto real e fazê-lo prestar muita atenção em momentos-chave em que ele precisa se concentrar em entender o que está acontecendo ou para poder pelo menos deduzir o que vai acontecer”, diz
Aves raras
Para Diego, um som marcante incluso no filme é o do uru-do-campo (Colinus cristatus). “É um pássaro com vocalizações muito comuns e fáceis de identificar. E este som, além de ser presente em toda a série, também me parece interessante porque sempre o associei à loucura de José Arcadio Bundía, quando começa a experimentar alquimia e a criar inventos”.
Além disso, o biólogo percebeu que muitas pessoas se interessaram pelo tangará-principe (Chiroxiphia lanceolata). “Talvez porque seja um pássaro que raramente aparece na TV ou no cinema. Ele aparece no primeiro episódio, e muitos reconheceram seu som. Isso trouxe a noção de que os sons das aves reais do Caribe colombiano desempenhariam um papel importante na série”.
Tangará-príncipe (Chiroxiphia lanceolata)
Rodrigo Gaviria Obregón
Segundo Diego, esse saltarim tem comportamentos reprodutivos muito complexos e bonitos. “Talvez seja uma das espécies com o repertório comportamental mais raro que canta em Cem Anos de Solidão”, finaliza.
O aracuã-de-asas-castanha (Ortalis garrula) também marca presença na série e pode ser considerada rara porque está distribuída somente no Caribe colombiano.
“Essa, por exemplo, é uma espécie que se considera rara porque não está em outros países. Mas, se você está no Caribe colombiano, nos lugares onde ela habita, não é uma espécie de poucos indivíduos, nem é muito difícil de encontrar. Pelo contrário, ela é barulhenta”, comenta.
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