Do biquíni à camisa social: Como o figurino muda para ajudar a contar história de ‘Ainda estou aqui’


Figurinista explica como peças situam emoções e contexto dos personagens. Imagens reais da família Paiva e antigas fotos de personalidades foram referências para visuais. Cena do filme ‘Ainda estou aqui’
Divulgação
Muito além de ajudar a reconstruir o passado, o figurino do filme “Ainda estou aqui” serve para situar o estado emocional dos personagens — e o contexto político e social em que estão inseridos.
A figurinista Cláudia Kopke explica, em entrevista à GloboNews, como as roupas ajudam a contar a história real da família Paiva:
“A Eliana [Luiza Kosovski] era uma personagem que ficava de camiseta molhada e biquíni, sentada no sofá. No momento em que ela vai pro DOI-Codi [centro clandestino de tortura da época da ditadura militar], a Eunice já escolhe a roupa dela: uma calça, uma camisa”, exemplifica.
“A própria Eunice [Fernanda Torres] não vai de saia, vai de camisa. E ela fica mais rígida, você perde um pouco do colar, da saia molenga, das coisas que ela usava e vão endurecendo.”
Assista ao trailer de ‘Ainda Estou Aqui’
Trabalhar com uma história baseada em eventos reais e com personagens que ainda estão vivos trouxe uma complexidade única para a produção de figurino do filme, segundo Claudia.
“Geralmente, quando você trabalha com pessoas que estão vivas e têm a ver com a história, é bom e também cria um pouco de dificuldade. Você não está imitando, copiando, está se inspirando. E isso é desafiador.”
Para uma história que se passa entre os anos 1970 e 2000, a intenção não era meramente copiar os trajes dessas épocas, mas se inspirar neles para criar uma representações autênticas e fiéis. Ao reproduzir o estilo dos anos 70, por exemplo, ela precisou incluir também elementos da década anterior.
“Quando a gente tá montando uma década, [tem que pensar que] não é todo mundo que virou a chave, ficou moderna, com pantalona, golona… [As pessoas] estão vindo dos anos 60. Então, normalmente, quem é mais velho mantém uma roupa mais dos anos 60.”
A personagem Veroca (Valentina Herszage), por exemplo, é a filha mais velha e mais antenada, que na história viaja para Londres. Isso permitiu a Claudia brincar com mais elementos da moda dos anos 70, criando um contraste com outros personagens.
Fernanda Torres e Valentina Herszage em ‘Ainda estou aqui’
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Garimpo
O garimpo de tecidos e estampas autênticas não foi uma tarefa tão simples. A figurinista detalha o processo:
“Trabalhamos com acervo. Então, foi reunido acervos de figurinistas, de brechós de São Paulo e do Rio. Fizemos uma sala imensa, cheia de roupas, pensando em cada personagem.”
Fotos reais da família Paiva e imagens de personalidades das épocas retratadas ajudaram a compor os visuais, mas reproduzir alguns desses figurinos foi particularmente difícil, porque os tecidos originais não estão mais disponíveis no mercado. Claudia precisou usar truques para imitar a rigidez ou a maleabilidade dos tecidos antigos.
Eunice Paiva (à dir.) com certidão de óbito do marido, Rubens Paiva; advogada foi interpretada por Fernanda Torres (à esq.) em ‘Ainda Estou Aqui’
Reprodução
Ela diz que trabalhar com figurinos dos anos 70 trouxe memórias pessoais, que acabaram influenciando suas escolhas.
“Eu fui a Londres quando tinha 14 anos, fui na Biba, loja icônica, e tenho muita lembrança das coisas. O casaco com o qual a Veroca vai, que tinha que ser algo entre o moderno e o antigo, eu sabia qual eu queria, sabia o tipo de coisa que tinha na minha memória.”
Uma produção original do Globoplay, o filme brasileiro que concorre em três categorias do Oscar já foi exibido em 17 países e ganhou 38 prêmios no circuito de festivais e premiações do cinema.
Baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva, ele conta a história de resistência de sua mãe, Eunice, que vê o marido, Rubens Paiva (Selton Mello), ser levado por agentes da ditadura militar no Brasil.
Guia musical de ‘Ainda Estou Aqui’: como MPB ajuda a contar história do filme

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