Lenin Tamayo faz sucesso no TikTok ao misturar cultura andina com gênero sul-coreano. A ideia é fundir o que ele orgulhosamente chama de ‘origens’. Lenin Tamayo, um artista peruano que segue o movimento musical chamado K-pop, mas o funde com a língua quíchua para chamá-lo de Q-pop, posa no telhado de sua casa em Lima
Ernesto Benavides/AFP
Lenin Tamayo se parece, soa e se movimenta como um cantor de K-pop, mas, na realidade, gosta de Q’pop, uma adaptação do fenômeno musical coreano para a língua indígena dos Andes do Peru misturada com o espanhol.
Aos 23 anos, o artista faz sucesso no TikTok unindo o gosto pela glamourosa indústria do K-pop com o pop cantado em quíchua, língua falada por 14% dos 33 milhões de peruanos. A ideia é fundir o que ele orgulhosamente chama de “origens”.
Lenin grava suas músicas num modesto e improvisado estúdio de 20 metros quadrados, dentro do telhado de uma casa no populoso bairro de Comas, ao norte de Lima.
“Pensei em transferir minhas raízes andinas para a música, misturar o andino com tendências globais como o K-pop. O Q’pop me permite validar minha existência, posso dizer de onde venho. É um conceito muito forte e disruptivo”, disse Lenin em entrevista à AFP.
Lenin Tamayo, um artista peruano que segue o movimento musical chamado K-pop, mas o funde com a língua quíchua para chamá-lo de Q-pop, se apresenta em uma rua no centro de Lima em 5 de junho de 2023
Ernesto Benavides/ AFP
Para ele, o pop quíchua é um protesto contra a ideia reducionista sobre o mundo andino. Quíchua, ou quechua, também está vivo em algumas regiões do Brasil, Argentina, Bolívia, Colômbia, Chile e Equador.
O artista compõe todas as letras, nas quais fala sobre suas terras, amor e liberdade, desafiando as barreiras linguísticas.
“Você não entende ou não quer entender? / Estou falando em espanhol, quíchua ou inglês. Não importa o idioma, o certo ou errado / Você sabe que não estou mentindo / Eu digo o que eu sinto”, canta Lênin em “Imaynata”, sua obra mais famosa.
No final de 2022, ele começou a ser um fenômeno nas ruas e no Tik-Tok, onde hoje conta com quase 198 mil seguidores. Seus vídeos somam 4,2 milhões de curtidas.
No Instagram, YouTube e Facebook, possui mais de 85,3 mil seguidores. No Spotify, atinge uma audiência mensal de 3,8 mil ouvintes.
Renovando o Quechua
Lenin Tamayo, um artista peruano que segue o movimento musical chamado K-pop, mas o funde com a língua quíchua para chamá-lo de Q-pop, se apresenta em uma rua no centro de Lima em 5 de junho de 2023
Ernesto Benavides/AFP
O pioneiro do pop quíchua no Peru usa o cabelo liso repartido ao meio, no mesmo estilo dos membros do BTS, primeiro grupo de K-pop a alcançar sucesso nos Estados Unidos e no Reino Unido.
Em um fim de semana, no final da tarde, Lenin se apresenta para alguns fãs da cultura K-pop.
Junto com uma calça jeans, um par de tênis e uma camisa preta sem mangas, ele veste um poncho e um cinto grosso com gravuras multicoloridas do mundo andino, enquanto mantém o ar de uma figura pop coreana.
Fã de k-pop posa antes de show do cantor peruano Lenin Tamayo, no centro de Lima
Ernesto Benavides/AFP
“Você é o melhor cantor que já ouvi!”, lança um adolescente, a quem Lenin abraça em meio a um agradecimento.
“É difícil encontrar canções modernas em quíchua porque quase ninguém faz isso, então eu gosto [de Lenin] porque ele é diferente”, diz Tiara Yoshioka, espectadora assídua das apresentações de rua do peruano.
Movendo consciências
Lenin Tamayo, um artista peruano que segue o movimento musical chamado K-pop, mas o funde com a língua quíchua para chamá-lo de Q-pop, posa no telhado de sua casa em Lima
Ernesto Benavides/AFP
Nascido em Lima, Lenin Tamayo aprendeu quíchua em casa com sua mãe, Yolanda Pinares, cantora de música popular andina nascida em Cusco, antiga capital do Império Inca.
Ele conta que sofreu bullying na escola, mas encontrou no K-pop uma “comunidade acolhedora”.
Hoje ele quer que sua música ofereça à juventude uma “esperança de que ela possa manter sua identidade e abraçar as tendências mundiais”.
“As pessoas entendem o coreano no K-pop?” Lenin questiona, acrescentando que a língua quíchua também pode ser uma “ferramenta para mover consciências devido o potencial sonoro e cultural”.
A língua está chegando aos jovens por meio de gêneros musicais estrangeiros como pop, rap, reggaeton ou trap, diz o crítico musical Oscar García.
Para ele, isso se deve ao fato “dos jovens do interior do país não perceberem o folclore como uma música deles”.
“Respeitam e ouvem onde seus pais estão, mas se envolvem muito mais com a chamada música urbana, onde se sentem no direito de cantar [em quíchua] o que gostam”, acrescenta García.
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